Na sociedade de consumo em que vivemos imbuídos, não nos damos conta de que praticamente tudo o que se afigura à nossa volta é metaforicamente passível de ser consumido. Os conteúdos veiculados pelos mass media, as mensagens inseridas nos spots publicitários, a sinalética nas ruas, a decoração das lojas, a disposição das montras, tudo corresponde a uma espécie de fórmula consumível.centro comercial como mass media
O exemplo mais significativo e sintomático deste fenómeno é o centro comercial. Portador de inúmeros canais de comunicação aliados a poderosos mecanismos de publicidade, o centro comercial está para a sociedade de consumo, como a televisão ou a Internet estão para o campo dos mass media, afirmando-se com semelhante poder e equivalente projeção no seio da cultura de massas, relativamente à qual pode ser analisado como produto e, simultaneamente, como produtor, mas também do meu ponto de vista como mass media.
O centro comercial insere-se no quadro dos mass media, já que se trata ele próprio de um meio de comunicação que se dirige às massas, influenciando-as através dos seus veículos de transmissão de mensagens. O centro comercial proporciona ao cliente poder ver-se a si mesmo refletido no ecrã a que não escapa, como defende o sociólogo e filósofo francês Jean Baudrillard (1929-2007) ao referir-se à noção de hipermercado. Do hipermercado baudrillardiano, é possível fazer a ponte para o domínio do centro comercial e entrar num mundo totalmente mediático e mediatizado. Os diferentes canais de comunicação do centro comercial transferem-nos para o universo dos mass media, donde cada medium ressalta à vista como uma extensão do corpo humano, na aceção do investigador canadiano Marshall McLuhan (1911-1980).
A avaliar pela centralidade que o consumo hoje tem, podemos falar do centro comercial como difusor de modos culturais, não apenas na medida em que expõe, publicita e comercializa produtos e conteúdos culturais, mas também porque cria e alimenta uma cultura de comportamentos que se consubstancia na tendência para todos os seus visitantes apreciarem, comprarem e usarem o mesmo tipo de artigos. Estamos a falar do centro comercial enquanto fator da cultura de massas. Mas ao estar atento aos gostos e preferências dos consumidores, mesmo que esses gostos e preferências sejam já um reflexo da sua influência, o centro comercial também constitui um produto das tendências da cultura de massas.
No processo de criação e difusão da cultura, o centro comercial possui um papel tão central e preponderante como o dos mass media, precisamente porque, na sua função comercial de apresentação de artigos de moda, de pop art, culturais e de lazer, dirige-se a um número massificado de indivíduos. Como no caso dos mass media, o conceito de cultura deixa no âmbito do centro comercial de estar associado aos conceitos basilares apreendidos por intermédio da educação, passíveis de hierarquização segundo uma lógica classificatória, para se transformar, na aceção do filósofo francês Abraham Moles (1920-1992), numa espécie de “cultura-mosaico”, que se traduz nas ideias de fragmentação, ausência de pontos de referência e aleatoriedade.
O centro comercial opera no campo mediático, alicerçando-se eficazmente no poder dos media e construindo com eles uma ponte entre os diversos públicos e a realidade social. Acresce neste quadro interpretativo o fenómeno do consumo, indesligável da cultura de massas. Ao consumo, por sua vez, estão estreitamente ligados o prazer e o desejo. O sociólogo francês Edgar Morin chama-nos a atenção para o facto de a cultura de massas se oferecer como um divertimento passível de ser alvo de escolhas individuais. E é em consequência deste tipo de cultura que o centro comercial se apresenta como mentor e legitimador do sistema mediático, criador de mitos e modelos simbólicos, representativos de personalidades associadas a condutas e comportamentos socialmente admiráveis.
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