Num destes dias, convidaram-me na qualidade de autora do Entre|Vistas para dar a conhecer as minhas escolhas na edição online da LuxWoman, na rubrica As Escolhas De… Ideias iam e vinham e, como era do Entre|Vistas que estávamos a falar, não hesitei em identificar para as minhas escolhas as 7 categorias do site. Uma forma de destacar alguns dos conteúdos mais emblemáticos em cada uma das áreas editoriais que o Entre|Vistas integra. Ora vejam o resultado:  

Perguntar: 

Através da gestão editorial do Entre|Vistas, concretizo um dos meus projetos mais compensadores. Oficinal e, ao mesmo tempo, muito emocional. Permite-me eternizar uma das coisas que mais gosto: entrevistar, perguntar. Na mesma aceção do poeta e padre José Tolentino Mendonça, no seu livro O Hipopótamo de Deus, acredito que é nas nossas perguntas que levamos connosco as nossas melhores respostas.

É nesta lógica que no Entre|Vistas publico entrevistas a personalidades com contributos nas mais diversificadas áreas do conhecimento. Já passaram pelo Entre|Vistas especialistas das artes plásticas, como Pedro Proença, da dança contemporânea, Miguel Duarte, da economia, Pedro Pita Barros, da engenharia aeronáutica, Rui Simões, da religião e fé, Vítor Feytor Pinto, da literatura, Afonso Cruz, Ana Margarida de Carvalho, Carlos Campaniço e Maria do Rosário Pedreira, da música, Frederico BC, ou da ciência política, como Marina Costa Lobo. Com cada um deles, amplio o meu olhar até ao infinito. Primeira categoria do Entre|Vistas: Entre Vistas.

Ver (em vez de olhar):

Ganhar a autenticidade do real através da visão apurada e, com isso, estruturar a visão do mundo. E – só depois – opinar sobre novos/velhos conceitos, espaços, artes e ideias, estar a par do que acaba de nascer, sem perder o que vem de trás, o que é antigo, sem ser velho. E é a ver (em vez de olhar), naquele sentido do saudoso João Lobo Antunes – «ouvir com outros olhos» – que tenho descoberto alguns dos projetos mais curiosos, intemporais.

Falo, por exemplo, da marca Graven. É centenária. Remonta ao início do século XX, a uma Oliveira do Hospital bem longínqua, com o sentido comunitário típico dos lugares descentralizados. É a marca bandeira das botas Swain, que sobreviveu geração após geração. Um avô, seu primeiro proprietário, vendeu as botas no mercado. O pai (seu filho) vendeu-as numa loja. O neto vende-as na internet. É uma marca, são três gerações e são cem anos. Com um legado que se adaptou, mas não se perdeu. Transformou-se. E o Entre|Vistas quis divulgar. Entretanto, foi tema que deu que falar um pouco por todo o lado. Segunda categoria do Entre|Vistas: A meu Ver.  

Ler:

Disse um dia Gonçalo M. Tavares que «o livro é o objeto de culto da lentidão». A lentidão a que também já se referiu Milan Kundera, o escritor que li até à exaustão na minha adolescência e que por isso passou a determinar a minha relação com os livros vida fora (pelo menos, assim o diz Eduardo Lourenço sobre os livros que lemos quando somos jovens). E é a ler que me entendo, que entendo o outro, que entendo o mundo. E, nessa velocidade menor que é a lentidão (hoje abençoada), vou sublinhando, rascunhando, comentando os meus livros.  

No Entre|Vistas falo sobre os livros que leio e que volto a ler e a propósito dos quais acredito poder partilhar valor e contribuir para a consciência social aonde a literatura sempre nos leva. Um dos livros sobre os quais já escrevi e que é de resto um dos da minha vida é A Paixão segundo G.H, de Clarice Lispector, a escritora que até hoje mais me desconcertou. Ela é um impulso vulcânico. Não tem género específico, está acima disso. Não tem cânone, está além disso. Até na beleza, fora de qualquer padrão instalado. O seu livro que mais me apoquentou foi, de facto, A Paixão segundo G.H, uma criação inquietante, uma busca interior perturbadora e uma investigação à própria identidade, metaforizada na arrumação de um quarto onde a protagonista se esbate num vazio incomensurável e na tomada de consciência da fragilidade humana. De 1964, é um tratado sobre a condição humana, uma analogia, se quisermos, da paixão de Cristo. Terceira categoria do Entre|Vistas: Livros em Revista.   

Viajar lá fora:

Nas viagens que fiz, destaco sem hesitações a viagem a Timor-Leste (a primeira, porque já lá estive duas vezes). Nunca no apogeu da minha juventude pensei em visitar esse que é um dos mais jovens países do mundo. No agosto quente de 1999, Portugal transpirava os anseios de um povo que optaria livremente pela independência. Em Lisboa, a minha cidade, organizavam-se cordões humanos, panos brancos recortados e mensagens de apelo e esperança. Num abrir e fechar de olhos, todos se reviram na capacidade de resistência dos timorenses e, sobretudo, na sua vontade incontornável de desenhar o próprio destino: ver Timor-Leste renascer como nação independente. Aquela à qual eu iria nove anos depois, em 2011, com a mesma vontade de desenhar o próprio destino.

Para trás tinha deixado a extraordinária ilha de Bali, os seus sorrisos rasgados e a serenidade contagiante do hinduísmo que por lá se pratica. No avião de uma companhia aérea indonésia, hoje falida, parti com destino a Díli. Lá chegada, fui de rompante para Ataúro, uma ilha timorense onde habitam em condições pré-históricas cerca de 4 mil pessoas. Esperava-me um eco resort, cujos requisitos simples exigiam um assumido à vontade com a natureza. Os quartos, exíguos, incluíam pequenas camas forradas com uma rede mosquiteira, uma discreta mesa de cabeceira e um cabide com um cesto pendurado, daqueles que as mulheres timorenses levam à cabeça. Um dos grandes ensinamentos que Timor-Leste me deu começou em Ataúro. Na proximidade das gentes, das crianças extasiadas sempre que me veem chegar. É o ser humano a cru… E, como num fado que por lá ouvi naqueles dias, «há gente que fica na história, da história da gente (…)». De volta a Díli, seguiu-se a preparação da ida para Jaco, a ilha virgem – e sagrada aos olhos dos autóctones – na ponta mais oriental de Timor-Leste, que me deixou o coração a bater mais depressa. De novo em Díli passei pelos ícones todos, dispersei do centro para outros lugares, como Maubara, deixei-me misturar nas cores dos tais, na simplicidade das gentes, no singelo apelo que todos os timorenses transportam no olhar. É no Entre|Vistas que publico as viagens da minha vida, como esta, com pontos de interesse que considero dignos de arquivo num guia/relato de viagem a partilhar com quem comigo partilha os mesmos destinos. Quarta categoria do Entre|Vistas: Vi lá Fora.    

Viajar cá dentro:

Portugal, dos mais antigos países da Europa, é uma paixão. Maior, à medida que vou e volto. Por cá, tenho visto do bom e do melhor. No Entre|Vistas, sobre Portugal, partilho as experiências e os percursos dentro de portas, que consolidam a perceção sobre a identidade do país, a origem das suas gentes, a história dos seus lugares, a expressão e o impacto da sua cultura e das suas artes.

Destaco a exposição José de Almada Negreiros: uma maneira de ser moderno, no ar até 5 de junho, no Museu Calouste Gulbenkian. Uma verdadeira antologia, com mais de 400 obras mostrando o artista completíssimo nas suas vertentes múltiplas de pintor, ilustrador, performer, escritor, cenógrafo, ator, humorista/caricaturista. É uma visão da modernidade na sua totalidade. Um retrato das peças mais relevantes que marcaram a arte portuguesa do século XX. Almada multiplicou-se como artista através de uma imensidão de linguagens, mostrando que ser moderno é antes de mais ser autêntico, original, excluindo qualquer hipótese de importar modelos ou figurinos. Na conferência O Desenho, ocorrida em Madrid, em 1927, Almada disse: «Isto de ser moderno é como ser elegante: não é uma maneira de vestir mas sim uma maneira de ser. Ser moderno não é fazer a caligrafia moderna, é ser o legítimo descobridor da novidade“. Podia ter ficado por aí. Que é tanto. Quinta categoria do Entre|Vistas: Vi cá Dentro.     

Comunicar:

Comunicar é o ato que mais aprecio, é a competência que mais anda lado a lado com isso de ser humano, com a relação com o outro, com a integração numa comunidade, na sociedade, com a liderança. Sim, com a liderança. Não reconheço a ninguém a capacidade de líder que não tenha simultaneamente enraizada a capacidade de bem comunicar.

E porque a comunicação é também a minha formação académica, partilho no Entre|Vistas a minha visão sobre os mass media tradicionais, as indústrias culturais e criativas e as soluções tecnológicas emergentes, no pressuposto de que a evolução vertiginosa da cultura mediática tem impacto direto na forma como comunicamos e vemos o mundo. A preponderância/ditadura da imagem arrebata-nos a forma de pensar e de comunicar. Eduardo Lourenço diz, até, que «a era da imagem nos infantilizou». E, na televisão, o primeiro ecrã a mudar o mundo, temos cada vez mais imagens e menos palavras. Sempre foi assim, mas hoje é ainda mais.  

Foi por isso que partilhei em janeiro uma grande estreia – a contraciclo – que se deu por estes meses na RTP2: Curso de Cultura Geral, de Anabela Mota Ribeiro. Declinando para uma versão mais livre e desenvolvida de um trabalho que fez para o Público, “O que é ser culto hoje?”, a jornalista Anabela Mota Ribeiro interpelou subliminarmente, numa edição de 13 programas, 39 convidados, que contribuíram para responder à grande pergunta. Partindo da lógica de que não há uma lista fechada e paralisada de ícones e referências culturais, um único modo de interpretar a cultura, uma fórmula isolada de interiorizar o real, três pessoas em cada um dos programas deram no ecrã de televisão a sua própria noção de cultura, discorrendo sobre as suas experiências culturais, o seu valor e significado e, ainda, suas repercussões na vida quotidiana. Sexta categoria do Entre|Vistas: Visão de Consumo.     

Ser mãe:

Provavelmente o mais abrangente e transversal papel que podemos assumir, aquele que não compete com nenhum outro e que nos exige uma comparência a tempo inteiro. Aquele que transforma por completo o nosso eixo, o nosso tempo. Há sem dúvida um processo kafkiano nesta experiência, que nos reprograma, reestrutura, reinventa. O nascimento de um filho consiste, provavelmente, no eterno retorno personificado. É que não me parece que haja experiência nesta vida que nos garanta uma liquidez tão óbvia.  

E o Entre|Vistas nasce, precisamente, a par do nascimento do meu primeiro filho. Talvez a vontade secreta de ter algumas respostas “guardadas” para lhe dar quando se cruzar com a idade dos porquês. Ou, melhor dizendo, a vontade de o ajudar a encontrar as perguntas… certas. Ensinar um filho a saber perguntar será, porventura, dar-lhe a melhor resposta. Sétima categoria do Entre|Vistas: Mãe ao Microscópio.      

Paula Perfeito


+ Informação  Artigo LuxWoman

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