Vocacionado quer para quem nasceu na era anterior ao digital, quer para os nativos da Internet, este livro consiste numa reflexão fundamental do filósofo germano-coreano Byung-Chul Han sobre a fugacidade das coisas, ou seja, a transição da era das coisas para a das não-coisas em que o autor acredita estarmos, nesta atualidade em que consumimos informações como se “apenas” estivéssemos a respirar. O que o autor analisa, aqui, é uma «impercetível mudança de paradigma», centrada na passagem da posse para o acesso.
«As coisas são pontos de repouso da vida. Hoje em dia estão totalmente cobertas de informações, que são tudo menos pontos de repouso da vida. Não é possível atardarmo-nos nas informações. Elas têm um tempo de atualidade muito reduzido. Vivem do estímulo da surpresa. Precisamente devido à sua fugacidade desestabilizam a vida. Hoje, reclamam a nossa atenção em permanência. O tsunami da informação transmite a sua agitação ao próprio sistema cognitivo. As informações não são unidades estáveis. Falta-lhes a firmeza do ser». Esta vivência na infoesfera é uma ideia charneira no livro.
Ancorado em grande medida na memória e na sua fragilidade, o autor chama-nos, ainda, a atenção para a digitalização que «desreifica e descorporiza o mundo», pulverizando as âncoras de suporte às recordações. Byung-Chul Han refere que «o nosso espaço de memória se parece cada vez mais com um armazém, atulhado com enormes quantidades de todas as informações possíveis. A adição e a acumulação substituem as narrações». E avança, lembrando que apenas «as narrativas estabelecem significado e contexto. A ordem digital, isto é, a ordem numérica, não tem história nem memória, pelo que fragmenta a vida».
Outro eixo desta apologia é o tempo, previsivelmente, e a sua relação com a verdade. O tempo em que agora vivemos não se compagina com a verdade, porque essa leva muito tempo a desenhar-se e a ganhar clareza. Há, pois, segundo o autor, uma preponderância da eficácia sobre a verdade. E isso tem, naturalmente, consequências. «Tomamos conhecimento de tudo, sem chegarmos a conclusões. Viajamos para toda a parte sem adquirirmos experiência. Comunicamos ininterruptamente sem participarmos numa comunidade. Armazenamos grandes quantidades de dados sem perseguirmos recordações. Acumulamos amigos e seguidores sem nos encontrarmos uns com os outros. As informações desenvolvem assim uma forma de vida sem estabilidade e duração».
Ora, mas se a cultura, no seu significado mais lato e relacional, está intrinsecamente ligada ao sentido de comunidade, na era do digital não há tempo nem lugar para o físico, o tátil, o ser. «A digitalização faz desaparecer o outro como olhar». E este desaparecimento é, diz, um «acontecimento dramático». Byung-Chul Han vai mais longe: «O olhar constrói a confiança primordial». E, voltando à ditadura das informações, sublinha: «Se subordinarmos por completo a vida a funções e informações, expulsamos dela o divino». E associada a esta ideia, o filósofo germano-coreano liga uma outra igualmente primordial: «O desastre da comunicação digital deriva de não termos tempo para fechar os olhos». Isto é, para contemplar. Porque tudo à nossa volta está, afinal, ancorado num ego fortalecido, apostado num ecrã reivindicativo de atenção permanente e num tempo que não tem tempo.
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