Em 2023, como se de um fio condutor se tratasse, acompanharam-me dois livros ligados a um dos líderes mundiais mais carismáticos, o Papa Francisco. Francisco O Caminho, um livro em que a jornalista Maria João Avillez relata os episódios e as emoções inerentes ao momento transformador da sua vida em que, em 2022, entrevistou o Papa, em Roma, com transmissão televisiva pela TVI. O outro livro, Não Tenham Medo!, com a coletânea dos discursos e homilias do Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), em agosto, em Lisboa.

Francisco O Caminho, de Maria João Avillez

Neste pequeno livro, que é uma daquelas obras que Deus efetivamente quis e que o homem sonhou e que por isso se fez, há nas palavras do Prefácio, de Vasco Pinto de Magalhães S. J., uma menção ao «entusiasmo lúcido e a todo o momento revelando o seu bom humor» que caracteriza o Papa Francisco, em concreto nesta entrevista dada à jornalista Maria João Avillez.

Uma entrevista que abordou a Igreja em Sínodo, esse estar «juntos – no caminho»; fez a antevisão desse evento que universalizou a juventude, a JMJ entretanto realizada, em agosto, em Lisboa; desconstruiu uma ideia de juventude e de futuro; falou sobre rezar e a presença do Espírito Santo; e apontou para a importância da mulher no mundo.

Maria João Avillez partilha connosco, num estilo confessional e próximo, a sequência de momentos que antecederam a realização da entrevista, desde a chegada da confirmação de que a entrevista se realizaria efetivamente, passando pela preparação necessária ao momento que na sua visão «exigia competência e responsabilidade».

Quando entramos na conversa, que é um caminho brilhantemente guiado pela mão firme da entrevistadora, observamos um Papa que nos fala da linguagem própria dos jovens: «há uma cultura da juventude, a qual provém da própria criatividade da juventude». Por contraponto, se quisermos, à dos adultos, sobre os quais diz: «Nós, adultos, temos já mais experiência de vida, protegemo-nos mais. Defendemo-nos. Os jovens são muito mais audazes».

E vai mais longe: «Os jovens não caem no duplo sentido, ou seja, na “linguagem diplomática”, em que uma pessoa diz uma coisa mas pensa outra». Nestes olhos postos na juventude, o Papa introduz a importância da convivência entre gerações: «A cultura do avô e da avó é uma das maiores bênçãos… Quando um jovem vai em frente, olha para o futuro, mas tem de ser capaz de dialogar com os mais velhos».

Recai sobre a conversa também a rotina de oração do Papa Francisco, que nos fala de rezar como «estar na presença de Deus e deixar que Ele fale». E de um apelo a que cada um reze como o Espírito Santo o inspirar, sem padrões nem fórmulas. «É o Espírito Santo que motiva a pessoa a fazer alguma coisa», diz, referindo-se à diferença entre a ordem e a harmonia. «Na harmonia há vida e é isso que faz o Espírito Santo».

Nesta entrevista, assistimos a um Papa que faz a apologia da mulher: «“A” Igreja é mulher». Adverte que a «entrada das mulheres não é uma moda feminina, é um ato de justiça que culturalmente tinha sido posto de lado». E reforça o perfil da mulher: «a mulher nunca abandona o que está perdido».

A pessoa que se revela nesta conversa, além do papel papal, é um ser incrivelmente próximo, que nos vem falar, de coração aberto, de um ativo em défice na sociedade atual: a esperança.

O Caminho | Não Tenham Medo! 74

Não Tenham Medo!, Papa Francisco

Entre 1 e 6 de agosto de 2023, presenciámos em Lisboa um dos eventos mais relevantes alguma vez acolhidos em Portugal: a JMJ, que congregou jovens, personalidades mediáticas e instituições de todo o mundo.

Neste livro, que reúne os discursos e as homilias do Papa Francisco nos diferentes cenários da JMJ, temos acesso a «um olhar mais distanciado sobre tudo o que vivemos», de acordo com D. Américo Aguiar, que assina o Prefácio. Encontramos, entre os várias palavras do Papa Francisco, uma homenagem implícita à cidade de Lisboa, «que abraça vários povos e culturas».

«As grandes questões de hoje, como sabemos, são globais e já muitas vezes tivemos de fazer experiência da ineficácia da nossa resposta às mesmas, precisamente porque o mundo, diante de problemas comuns, se mantém dividido, ou pelo menos não suficientemente unido». Lemos entre as suas intervenções. No contexto da JMJ, o Papa também nos disse que «no contexto geral duma globalização que nos aproxima, mas não nos dá uma proximidade fraterna, somos todos chamados a cultivar o sentido da comunidade».

O que Deus faz, diz-nos o Papa, e reforçou-o em Lisboa, é chamar-nos «para nos fazer caminhar, chama-nos para nos refazer». Chama-nos também para «esse levantar-se todos os dias para começar de novo ou para continuar o que se começou». Numa perspetiva peregrinante, «à procura duma meta», com «sentido de futuro, com saudade do futuro». E desconfiando das «fórmulas pré-fabricadas» e das «respostas extraídas da manga».

É incondescendente na atitude que é suposto assumirmos como cristãos: «Não basta que um cristão esteja convencido, deve ser convincente». Mas com a humildade que o caracteriza e que ficou ainda mais explícita numa das frases charneira que o ouvimos pronunciar na JMJ: «O único modo, a única situação em que é lícito olhar de cima para baixo uma pessoa é (dizei-o vós… forte!) para a ajudar a levantar-se».

E convocou-nos para as mudanças que se impõem neste tempo, com uma palavra de ordem que, na verdade, são três, sobre quem afinal deve estar envolvido: «todos, todos, todos».

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